quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Caderno

Quando voltei a morar em São Paulo, depois de um ano na Bahia, eu tinha 7 anos de idade e havia acabado de ser alfabetizada em "baianês". Explico. O alfabeto baiano era diferente, oras. O "éfe" é "fê", o "ge" é "guê". Acho que não conto nenhuma novidade.
A novidade estava no fato de eu voltar para São Paulo em meados de 1988 falando baianês com bastante fluência. Sempre fui influenciável. Se fico uma semana em qualquer região do Brasil, volto como se fosse nativa. Me perdi. Deixa eu voltar a história.
Primeiro dia de aula. Sala de aula da Professora Jussara. Minha mãe não ajudava. Além de cortar meu cabelo ao estilo indiozinho, me colocou uma conguinha vermelha e um caderno brochura com indiozinhos desenhado.
As crianças tinham capas de cadernos legais. E não só isso, espirais. E o que eu fazia com um caderno brocgura? Pergunte à minha mãe, por favor.
E a aula começa. Tiro de minha mochila meu caderno brochura de indiozinho. Parecia que eu tirava uma jararaca de dentro da mochila, e logo em seguida a engolisse ao som de uma música circense. Sim, os olhares foram esses. Tímida que sempre fui, só acentuei as covinhas, tirei a franjinha juruna do olho, e continuei o ritual do "São Paulo, 04 de Outubro de 1988. Hoje o dia está nublado". Bem, não sei que dia foi isso, e se de fato estava nublado. Mas eu gosto de imaginar que sim.
- Crianças, quem conhece o alfabeto?
Tentando tirar a impressão de freakshow, achei bacana levantar a mãe e dizer o alfabeto. E lá foi ele, ao som de birimbaus, trios elétricos e toda uma baianidade nagô. Todas, sim, todas as crianças da sala caíram numa gargalhada sem fim. Não felizes com este constrangimento, ainda cantaram a musiquinha que destrói qualquer criança - Não sabe, não sabe, vai ter que aprender...
A professora tentou explicar as diferenças regionais, mas isso não funciona com crianças.
Não preciso dizer que meu apelido virou baianinha, e que ninguém da sala quis ser meu amigo logo de cara.
Hoje seria bullying. Naquela época minha mãe deu um tapinha nas costas, disse que meu caderno era lindo, que eu era especial, e que os meus amigos de escola eram bobocas, e que crianças não tem memória. Ela tinha razão, uma semana depois, ninguém lembrava mais do incidente. Sem traumas, sem choro nem vela, sem terapeutas, e só risadas quando lembro. Acho que desaprendemos a criar crianças.

Tchau, criança


Era o ano de 1993 quando eu deixei de ser criança
E como sabemos que deixamos de ser criança? Pra mim, eu deixei de ser criança a partir do momento em que os meninos deixaram de ser bobos e feios, e tornaram-se príncipes encantados em cavalos brancos para me salvarem da torre da bruxa má. É isso, é exatamente este o momento.
Márcio da rua de cima. ...
Sim, porque na minha época os meninos além de nome e sobrenome, eles tinham referências geográficas. O menino da rua de cima, o pessoal da vilinha, a gangue da rua da farmácia, os meninos da rua sem saída. Voltando ao Márcio da rua de cima.


Ele era o menino cobiçado da rua. O menino que as meninas achavam lindo. A bola da vez do bairro.

Aniversário da Talita, 1993. Ah, você deve estar se perguntando como eu tenho tanta certeza que foi 1993? Bem, em 1993 passava "Mulheres de Areia". Eu sempre torci pela Raquel, eis uma confissão. Desde sempre preferi as vilãs. Mas também sempre soube que as vilãs não ficavam com os mocinhos. Naquele dia da festa pedi para minha mãe me ajudar no penteado Rute.
Era um pedaço do cabelo preso, e outro solto. Eu tinha um cabelo bem comprido, estava me achando a própria Rute. Coloquei minha melhor roupa nova da Pakalolo, coloridíssima e infantil, e fui para a minha primeira festa baile.

Não sei como funciona na modernidade, mas na minha época (como eu adoro dizer "na minha época"), tinha um lance de dançar com a vassoura. E como desde 1993 tem muito mais mulher que homem, muitas vassouras no salão. E lá estava eu dançando "Bed of Roses" com a minha vassoura, quando Marcio da rua de cima se aproximou e tirou a vassoura de minha mão.
Isso foi acompanhado por todos os presentes, pois Marcio da rua de cima havia acabado de chegar na festa e me escolhido como primeira par de dança.
E é neste momento, este exato momento que você usa tudo que aprendeu com a She-Ha, Moranguinho, Princesa Sara do Cavalo de Fogo, Rute e Raquel da novela, tudo que você viu nos últimos 12 anos, e sabe que é o momento de encostar a sua cabeça no ombro do Marcio da rua de cima.

Bem, no dia seguinte você vira celebridade da rua, se acha linda, compra o vinil da novela e ouve "Bed of Roses" até riscar o LP, pede para sua mãe mudar suas roupas, seu penteado,doa suas Barbies, não quer mais presente de dia das crianças, muda seu jeito de falar, suspira durante horas, não come, não estuda, e tudo vira o menino da rua de cima. Pronto, acabou a infância. Fato. De agora em diante você sentirá isso muitas vezes, mas Marcio da rua de cima, só vai ter um mesmo. Afinal, infância não acontece todo dia.

sábado, 8 de setembro de 2012

37230 dias

Meu avô tem 102 anos. Isso mesmo, 102 anos de muita vida. Trabalhador da roça, sol a sol diariamente. Imagine que ele viveu aproximadamente 37230 dias. Eu com meus 11315 sou formiguinha perto da sabedoria dos 37230 dias.

Quando eu era criança costumava passar minhas férias com ele. Ele tinha um depósito de castanha. Quando eu enchia muito o saco dele, ele me mandava contar castanhas. Elas ficavam num canto do depósito. E lá ia eu contar as castanhas. Quando chegava aproximadamente na centésima, eu já estava contando com muita má vontade. Saia batendo o pé e dizendo que trabalho infantil era crime. Ele ria.

Chegou o dia da revanche. Quando ele me mandou contar castanhas, eu disse que não sabia ir muito além do número cem, e que ele precisaria me ajudar a contar. Meu avô pensou, coçou a cabeça, deu aquele risinho sábio e disse "Eu preciso do número para passar ao comprador. Como ele vai comprar sem saber quantas têm?". Sentamos os dois em frente à montanha de castanhas:

- Sabe, vô. Eu não sei como o senhor aguenta este trabalho. Queria muito saber o que o senhor faz sem mim para contar todas essas castanhas. Eu só venho aqui nas férias. Acho que é por isso que o senhor anda cansado. É muita castanha para contar.

Naquele momento meu avô sentiu que era a hora de me mostrar a vida. Foi ao fundo do depósito, pegou a balança grande e pesada. E começou a encher os sacos de castanha.  Colocou sobre a balança e disse:

- Quando você não vem, eu uso isso aqui, tá vendo? O saco tem 20 quilos de castanha.

A minha boca abriu em formato de "o", era assim que eu fazia quando algo me impressionava.

- Mas e se o freguês não confiar na balança, vô. Se ele quiser saber quantas têm?

- Ele que leve e conte em casa. Se tiver faltando alguma, pode vir buscar.

E saiu pela portinha do depósito arrastando suas sandálias de couro. É assim que é meu avô, desvenda os mistérios do universo, e sai. Sai sempre enigmático, como quem disse algo que não podia dizer. Como se guardasse todos os segredos do universo, e só contasse pra mim.

Resiliência

Para o amor é preciso resiliência. Quando ouço ou leio a palavra resiliência, só consigo associá-la ao amor. Dizem por aí que é um conceito emprestado da física. A física que me desculpe, mas esta palavra não era para pertencer à ela. O amor tem por sobrenome resiliência.

Ninguém pode se dizer incapaz de amar, ou de ser amado. O amor é inerente. Independe de vontade, independe de esforço está ali, resiliente. Ele adapta-se, mesmo em terrenos desfavoráveis. Mesmo não sendo bem-vindo, instala-se e permanece intransigente, resiliente. Não aceita sair, mesmo que lhe seja dito os piores desaforos do universo.

Lembro do dia em que conheci o amor. A primeira vez que ele me olhou, eu não o conhecia. Nunca fomos apresentados formalmente, ele dispensa rituais. Abri os olhos e lá estava ele, nos olhos castanhos da minha mãe. E disse que dali não sairia nunca mais. E dos olhos castanhos, parou em mim. Habitou em mim. 

Às vezes o colocava de castigo, no cantinho para pensar. Mas ele nunca se importou. Porque ele nunca pensou. Esta é uma das características fortes dele, irracional. E quando menos se esperava, ele estava em todos os lugares.

Acredita que o encontrei dentro da minha lancheira da escola? Em formato de pão com mortadela. Empesteou o pátio do colégio. Alguns olharam estranho, uns até com cara feia. Mas ele nem se importou, me fez feliz mesmo assim. 
Uma vez ele se disfarçou de vitrola. Era meu aniversário de 15 anos. Dentro de uma caixa gigante esta ele, com laço de fita e tudo. E foi sob o disfarce de vitrola que ele nos alimentou a noite toda, dançando, cantando, rodopiando pela sala ao som de vinis. 

Muitas vezes eu quis desistir dele, mas ele nunca desistiu de mim. E já na vida adulta ele apareceu em forma de homem. Este homem não tinha rosto, eram letras escritas que formavam as mais doces palavras. E antes do homem em si, o amor veio em palavras, e depois veio em carne, e o homem um dia foi embora, mas ele permaneceu dentro de mim. 

E cada dia que passa, desde daquele 16 de junho de 1981 em que ele estava nos olhos da minha mãe, nunca mais me abandonou. Ele se disfarça de coisas inesperadas. Nem sempre vem em forma de gente. Mas sempre está ali, quer eu queira, ou não. Sempre me acompanhando. Pode ser nos momentos felizes, nos tristes. nos momentos de desespero, sempre comigo.

Olha amor, eu aprendi a gostar de você. 

Fiódor Dostoievski

Tenho uma dívida com a humanidade. Nunca li Dostoievski. Sim, isso é uma humilhação. Hoje, quem nunca leu, não é ninguém. Sendo assim, não sou ninguém.
Sempre que vou à livraria, pego "Crime Castigo" na mão, e me dá uma preguiça, uma preguiça descomunal. Uma preguiça além da vida.

O que acontece é que estou cansada de ler literatura moderna recorrendo ao Seu "Dostô" (sim, já estamos íntimos). Raskólhnikov sempre é citado. Nos dois últimos livros que li, tinha este diacho de homi. Um sentimento de Raskólhnikov é a expressão usada. Como posso entender a profundidade do personagem se nem sei quem porra é Raskólhnikov?

Ontem eu estava andando pela Augusta e parei nessas banquinhas que vendem filmes cabeça. Aliás, esta expressão é a pior de todas, "filme cabeça". Vou mudar para "filmes que as pessoas têm uma desgraçada preguiça de assistir porque requer muita atenção, e tem atores desconhecidos do grande público", ficou melhor. Voltando. Estava eu na banquinha quando dou de fuça com "Crime Castigo". Olho, bocejo, olho. Penso, "Vai, Viviane. Você pode dizer a todos que leu o livro. Veja este filme e acabe com o segredo de Raskólhnikov". Porra, isso seria burlar o regulamento dos livros clássicos. Clássicos são para ser lidos. "Você não pode burlar este regulamento, Viviane. Você leu Pirandello, lembra". Minha consciência é foda, detona toda e qualquer chance de burlar o regulamento dos clássicos.

Com muita dificuldade larguei o DVD. Foi neste instante que uma pessoa pegou o DVD, e resolveu levar. Não resisti e fiz a pergunta: "Você leu?". "Sim, agora quero ver o filme". Bom rapaz, bom rapaz. Ou seja, só vou comprar o DVD depois de ler o livro, e no original. Sim, porque daqui pra frente esta será a minha desculpa para "Crime Castigo". Não li porque ainda não aprendi russo. Sabe como é, quero ler no original.

E assim vou tocando a vida. Peguei meu "Cidadão Kane" e fui embora. Fui embora com a consciência tranquila. Só peço uma gentileza aos que me encontram pelas ruas da cidade, não me falem de Raskólhnikov, por favor.



Frescor

Ontem eu ouvi alguém  falar em frescor da juventude. Usar esta expressão é tão velho quanto tomar biotônico Fontoura. E quando se fala em juventude, tudo é fácil. Mas quando o assunto é infância, ninguém mais lembra o que se passou neste remoto tempo. Acredito que de 20 em 20 anos o cérebro faz uma varredura de arquivos, e vai apagando as coisas. A culpa não é nossa, é do anti-vírus. O meu anti-vírus está com defeito. Lembro de coisas da infância como se fosse ontem. Mas se me perguntarem o que eu comi ontem, dificilmente vou lembrar.

A infância teve gosto de chiclete bola Ploc e chocolate surpresa. E já não sei mais se as histórias que lembro ocorreram, ou se eu com a minha fantástica imaginação de criança, as inventei para fazer da vida algo mais saboroso. Este é o segredo de Tostines.

Voltando ao frescor. Eu acho que cada idade tem o seu frescor. Se bem que eu desconfio que a adolescência não tem muito, mas tem. A Adolescência é a fase em que o ser humano vira ermitão de si mesmo. O mundo não existe. Todos estão errados. Todos querem foder com a gente.

E visto que cada idade tem o seu frescor. O meu maior frescor aconteceu na infância. Decidido. Se hoje me perguntassem qual idade eu queria ter, responderia sem titubear, 7 anos (no máximo). As joaninhas sentem falta de mim. Eu tinha uma comunidade de joaninhas. Uma comunidade secreta onde eu montava parques de diversões, estradas, cachoeiras, e tudo que minha imaginação permitia criar em miniatura para a colônia das joaninhas. Eu andava pela rua balançando a minha maria chiquinha com determinação de quem sabe das coisas. Eu olhava para as pessoas. Me indignava com o morador de rua, e achava que minha mãe deveria levá-los para a nossa casa. Qualquer cobertor entre duas cadeiras era motivo para uma grande aventura no acampamento. Eu fazia arte com comida, pintava com a convicção de que era artista, falava eu te amo como quem diz bom dia. Não tinha medo do lobo mau, e me sentia princesa. E com as princesas, nada acontece.

Pra mim, frescor não tem nada a ver com pele, beleza, sorrisos brancos e hálito puro (Kolynos)!
Frescor são ideias frescas, sem preconceitos, é saber ouvir, e não se achar dono do universo nem da verdade absoluta. Frescor tem a ver com ideias, definitivamente. Frescor tem a ver com manter a coluna ereta, mente quieta e coração tranquilo. E isso acontece em qualquer idade.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

A Ilusão

Existe uma história que eu contei diversas vezes de diversas formas. Existe uma história que eu pensei diferente de tudo que existe no mundo. Melhor que novela, seriado e cinema. E olha que para ser melhor que cinema, precisa de muito esforço. Mas a minha história era assim, fantástica. Nela tinha a mocinha, o mocinho e o amor.
Mas não era fantástica a história? Sim. E existe algo mais fantástico que o trivial?
Então é isso que eu quero. É isso que eu espero. Parece aquele comercial da Nextel. Este é o meu mundo.
Desdenhei muito do amor. Desdenhei as histórias. Desdenhei aquilo que sempre quis comprar.
Onde compro? Onde vende? Cadê a parte que me cabe neste latifúndio? Sei-lá.

Só sei que a história que eu conto pra mim mesma nunca tem o final feliz que eu espero.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

A cirurgia

Em algum momento da sua vida alguém vai usar um bisturi em você.
Sei que parece dramático, e é horrível pensar sobre este tema, mas é importante. Em 30 anos nunca tinha aberto nada. Epa, peraí, a frase ficou tosca e inacreditável. Vamos reformular. Em 30 anos, que eu me recorde, nunca havia feito uma cirurgia. E acredito que lembraria se tivesse feito.

Eis que chegou a minha vez. Pilotos e médicos me assustam. Parece uma comparação imbecil, e é. Mas ambos me assustam mais do que palhaço, que também me assustava muito antes dos 8 anos de idade.
O piloto viaja diariamente com centenas de pessoas dentro de um avião e e ele faz isso com a maior naturalidade do mundo.
Às vezes tem um defeito no avião e ele diz "Ok, vamos decolar!". A minha vontade é de dizer "Hey, peraí mermão. Vamos decolar o caralho. Eu não saio do chão enquanto não estiver tudo 100% ok!". Mas eles são filhos da puta, fazem isso com a maior naturalidade do mundo. Voam faltando peça, voam com um motor, voam até sem asa (bem, isso foi exagerado).

Com os médicos a mesma coisa. Ontem, ao fazer minha primeira cirurgia com anestesia local, a enfermeira disse:

 - Hum (cara de que deu merda). Dr, o foco não está bom.

 Eis que entra uma outra enfermeira:

 - Xi, menina, o foco não está bom desde a semana passada.

 Um momento. Deixa eu ver se eu entendi. A porra do foco não está bom e mesmo assim vão cortar o meu joelho? É isso mesmo? A enfermeira volta a dizer:

 - Dr, o foco não está bom.

 Ele, como se isso não tivesse a menor importância diz:

 - Vou precisar de um número 8, viu?

 E como se o foco não fizesse diferença na vida dele, tocou o barco e abriu meu joelho na maior. Enquanto abria, batia o maior papo sobre a virada de tempo no feriado. E lá estava eu, a mortadela, ouvindo aquele assunto banal. Falar do foco, que era de fato o mais importante, nada. Eis que decidiram que a mortadela poderia participar do assunto:

 - Olha, vai ficar uma cicatriz.

 Fiz cara de pouco caso. Foda-se, já abriu esta merda, agora manda vê.
 E ao abrir o joelho, eis que meu joelho decide se vingar do pouco caso que fizeram dele. Espirra um jato de algo que faria filmes de terror contos infantis, bem na cara do médico. Admito que senti um pouco de prazer. Nem se eu tivesse maquinado isso, aconteceria com tanta precisão.
 E como se o fato do meu joelho estar aberto jorrando algo amarelo com sangue não tivesse a menor importância, ele saiu da sala para lavar o rosto. Sim, meus caros, se o foco estivesse ajustado, ele não teria tomado na cara.
Depois o efeito exorcista, ele finalmente falou:

 - Este foco está ruim, né?

Como não houve resposta da enfermeira, ele continuou o monólogo.

 - Viviane, acho que não vai resolver e é bem capaz do nódulo voltar. É um "ragatanga acerehê" (isso mesmo, não entendi porra nenhuma do que ele disse- então fiz a livre tradução).

 Já não queria mais papo com ele, nem com a enfermeira, e nem com o meu filhote Alien que ele fez questão de me mostrar no final. Acho que ele quis tornar inesquecível, só pode.

 O que os pilotos têm a ver com tudo isso? Tem que são tão filhas da puta quanto os médicos. Quanto mais medo você demonstra, mais eles querem te sacanear. Lição aprendida: Nunca demonstre medo à médicos ou pilotos de avião. O meu joelho? Ah, está aqui, doendo pra cacete.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

O tempo e as indefinições

O tempo tem passado muito rápido. Lembro quando tinha todo o tempo do mundo para tomar certas decisões. Física, química, dançarina de boate, dona de boteco, historiadora, astronauta. Era uma gama enorme de opções, e eu tinha todo o tempo do mundo para escolher.

Agora as opções são menores. Eu sou maior, e não me sinto assim. Ainda me sinto a mesma garotinha que acreditava que ainda havia tempo para tudo, mesmo não tendo mais. Ruim é quando você se dá conta que este sentimento é ilusório, não temos todo o tempo do mundo.

Então você entende que é melhor aproveitar todos os momentos como se fossem últimos, aproveitar tudo com bastante intensidade porque não sabemos se amanhã ainda teremos este tempo. Mas como aproveitar? Escolhe-se algumas porções de coisas que nos façam felizes. E quando aquilo que nos faz feliz não depende exclusivamente de nós? Mas espere, felicidade não deveria ser algo interno? Quem é feliz é feliz e ponto final?
Estes livros mentem. Felicidade é um negócio bem mais complexo do que se pode imaginar.

Mas voltemos ao tal tempo. Ele é o vilão e o mocinho. Bom para esquecermos coisas ruins, ruim quando ele demora a passar em momentos que deveria voar, triste quando ele passa e percebemos que não conseguimos o que queríamos - não atingimos a tal meta de vida. E quando não se tem uma meta pessoal? E quando se está tão perdido que não sabe exatamente o que fazer, pra onde ir, com quem contar? Passar o tempo é indigno de vida. Não combina com felicidade.

Tenho blog desde sei-lá quando. E você que costuma me ler, saiba, eu não sou feliz. Não tenho receita para a felicidade. Finjo ser feliz porque a sociedade quer assim. Afinal, quem já disse "amo meu amigo depressivo"?. As pessoas não gostam de gente triste. E se você chegou até esta linha, deve ter um pézinho na tristeza.

Gastei anos da minha vida esperando um alguém que JAMAIS existiu, somente na minha imaginação. Vivi histórias imaginárias, e acreditei do fundo do meu coração que apareceria alguém que me faria companhia pro resto da vida. Já não consigo mais acreditar. E isso era algo muito importante pra mim. Perdi algo muito importante, a fé. E já não sei como recuperá-la.

domingo, 15 de janeiro de 2012

JENIAL*

Toda vez que eu faço planos revolucionários que mudarão a humanidade, quer dizer que me farão mais humana, algo acontece. Acordei cedo com o seguinte plano: "Vai, Viviane, pelo menos fazer as unhas!". Tomei um banho que faria o Cielo querer me tirar a foça do banheiro. Ao sair do banheiro, tchanammmmm CHOVENDO.

Assim não dá. Pra mim a regra é clara, não se sai na chuva quando não se é obrigado - tipo dia de trabalhar. E cá estou eu sentada, feito criança entediada caçando o que fazer.

Coisa pra fazer sempre tem. Tem meu guarda-roupas que não vê uma arrumação desde....desde...desde que ele foi criado. Tem uma tonelada e meia de roupas para lavar e passar. Tem a minha reunião de resultados que eu não fiz e poderia aproveitar este dia para fazer. Enfim, coisa tem. Mas eu não quero! Como lidar?

Eu prefiro ficar pensando atrocidades que incluem desde cirurgia plástica à escrever um best seller do que fazer o que preciso fazer, as coisas "práticas" da vida. Que de práticas não tem nada, vamos concordar minha gente.

Quem acorda com uma vontade insana de arrumar o guarda-roupas? Quem acorda com uma vontade enorme de trabalhar no dia da folga? Quem pensa "Hum, seria fantástico fazer uma faxininha só pra relaxar"? E se alguém pensa isso, por favor, encaminhá-la com urgência à terapia.

O problema todo está no "Ah, vai, eu posso fazer isso". Algum gênio descobre alguma coisa, escreve algo, e eu sempre acho que seria mega fácil fazer o mesmo. Não, eu não sou "jênia" (sic), mas sempre acho que posso ser. Sabe, lá no fundo dos meus 82 de QI (nunca fiz o teste, estou apenas chutando), devo ter algo genial que não estou dividindo com a humanidade. E o motivo disso? Minha constante e imensurável preguiça. Sim, meus caros, duvido que Einstein tenha sido um pândego preguiçoso.

Então é isso, vou revolucionar o mundo neste exato momento....

Ah....

Mas está chovendo. Amanhã, amanhã....
*(Com J e não me encham!)

sábado, 14 de janeiro de 2012

Feliz?

Me peguei lendo diários antigos. E como é bom voltar no tempo.
Os diários são máquinas do tempo. Lá vou ao ano que mais me interessar. Dou uma olhada em como estavam as coisas, e volto correndo para 2012. Porque saudade é um sentimento gostoso, mas deve ser apreciado com moderação, senão não se vive o presente.

Temos a tendência de vermos as coisas melhores do que elas realmente eram. O famoso eu era feliz e não sabia.
Na época da faculdade eu era feliz e não sabia? Acho que não. Eu acredito que felicidade é um sentimento que você sabe e sente quando ela aparece. Não é um lance que acontece todo dia. Gente feliz demais é irritante. Quem dirá todo dia. Chega a ser falta de higiene esta felicidade constante.

Os pequenos instantes, aqueles que passam num piscar de olhos, e que marcam para uma vida inteira, estes sim, são especiais. Eu tenho uma lista moderada deles. Tenho saudade, mas não quero revivê-los. Não quero voltar no tempo. Quero que o tempo avance, quero que a vida siga seu fluxo, quero que ela me mostre do que ela é capaz. Sempre se pode fazer melhor.

Lição aprendida e mentalizada. Nunca mais usarei a frase "Eu era feliz e não sabia". Porque estar feliz é um estado inconfundível.

Onde?

Onde eu estava quando te perdi? Como foi que isso aconteceu?
Parecia tão difícil apertar o botão "deletar" do coração, e da mesma forma que chegou - rápido e sem notificação - foi embora. Assim como um vendaval. Assim como música da moda, que gruda como chiclete, e vai embora.

Eu imaginava algo mais trágico para o fim. Mas parece que estou me acostumando com finais, e eles nem me afetam por muito tempo. A gente chora no cantinho, faz cena de novela, acha que o mundo não será mais igual, e quando percebe...se foi.

Eu procurei nos diários, procurei fotos, procurei o que podia para não deixar ir embora, mas foi mesmo assim.

Às vezes é bom sentir-se aliviada. Às vezes faz falta um pouco de drama mexicano. Sim, eu adoro ser dramática! Mas pode fazer bem deixar a vida fluir.

Entrou, deixou seu recado. Saiu deixando a notificação de que virá outro em seu lugar. Porque a vida é cíclica. Nunca achei que fosse dizer isso dela. Desculpa aí, vida, já manjei a sua.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

O coração bate

Hoje fui ao cardiologista. Me senti criança novamente. Acho que pessoas com 30 anos não marcam consultas com cardiologistas.

O médico foi um querido. Ao chegar no consultório já deu aquele largo sorriso, apertou minha mão, me olhou nos olhos e perguntou "Como vai esta coraçãozinho?". Sabe que deu vontade de chorar? Seria piegas demais se isso acontecesse. Eu tinha vontade de dizer que não estava nada bem, que eu estava sentindo dores fortes, e que me faltava a respiração e por alguns momentos eu achava que deveria seguir a luz, mas soaria dramático demais.

O que sei, é que o Doutor Roberto cuida do coração e da alma. Sei que ele conversa, e por alguns instantes achei que fosse ganhar um pirulito e um adesivo das princesas.
Ele afagaria minha cabeça e diria: "Vai lá, campeã. Este coração aguenta qualquer coisa!".

Uma pena o Doutor Roberto não cuidar de azedumes do amor. Adoraria ter uma poção que fizesse eu não sentir tanta falta de amor. O coração precisa de amor. Assim como quando eu ficar velhinha vou precisar tomar AS infantil para afinar o sangue, agora aos 30 anos, eu preciso de amor.

E não é este amor pela metade, este amor que eu amo sozinha. É um amor compartilhado. É sentir prazer nas coisas do dia a dia. É ter alguém para pedir para levantar e apagar a luz pra mim. Que ria das minhas piadas como se eu fosse a melhor piadista do mundo. Que ache graça no meu mau humor, que um dia me dê uma florzinha do jardim. Que deite na grama e me conte uma história. Eu quero esta cafonice toda, ok?

Cansei de amar sozinha. Cansei de viver contos de fadas em que o príncipe sai correndo de mim. Cansei de chegar em casa e não ter ninguém. Cansei de fotos fakes. Cansei de fingir uma felicidade que não existe. E como diria o poeta, é impossível ser feliz sozinho. Ser solteiro não é este mar de rosas que desenham. Não é legal, ok? Pronto, falei.

O tempo passa. E passar o tempo sozinha é uma das piores coisas da vida.

O Doutor Roberto disse que estava tudo bem, que eu ficaria bem, e que a dor no peito iria passar. Mas ela não passa. Ela nunca passa. Faz anos que espero passar. Mas não passa. É um buraco enorme no peito.

Falta aquelas canções, falta a poesia escrita em diário, falta a história, falta a vida, e às vezes me falta o ar. Melancolia que não sai de mim, não sai...


Éh, deve passar...