domingo, 24 de agosto de 2008

Preguiça

Domingo é um dia muito estranho. Deveríamos ter sexta, sábado, agum dia com outro nome, e segunda-feira.

Eu sei que é domingo pelo tempo. Parece que os passarinhos cantam diferente neste dia.

A minha mãe cozinha alguma massa, e o cheiro de molho se espalha pelo ar. Isso é o registo da monotonia.

Hoje eu comprei o jornal. Não consegui sair do caderno de esportes. Tentei ler a Ilustrada, mas não li nem meia matéria. A revista nem saiu do plástico. Ainda se eu estivesse muito atarefada, era de se entender, mas não era o caso.
Passei o dia de pijama assistindo filmes e comendo feito uma porca.

Opções não faltavam, o que faltava mesmo era ânimo de sair de casa.

Me trocar, achar que todas as roupas estão ruins, pegar o carro, procurar um lugar para estacionar, ou até mesmo ir de ônibus e ficar esperando mais de uma hora para que ele apareça. Só de pensar nisso tudo, me dava preguiça.

O domingo foi feito para descansar, dizia a minha vó. Eu sempre ria desta frase.
Começo a achar que vovó está com razão, como sempre.

A preguiça é um pecado capital tão bom!

Devolva meu sorriso!

Eu estudo na avenida Paulista, e trabalho também.
Às vezes tenho a impressão que eu moro lá.

Ontem durante a aula, ouvimos muitos gritinhos adolescentes. Tive uma vontade enorme de deixar o professor falando e correr para a janela. Posso garantir que eu não era a única que estava com esta vontade. Mas como seres humanos adultos e civilizados, apenas comentamos que o barulho estava incomodando, e continuamos sentados. Ninguém levantou para ver o que acontecia.

Na hora do intervalo entre uma aula e outra, não pensei duas vezes, desci para ver o que acontecia na avenida.
Deveria não ter descido. Centenas de adolescentes vestidos com saias e gravatas segurando cartazes com dizeres que quando eles crescerem terão vergonha:

- Devolva meu sorriso
- O sonho não acabou
- Eu não acredito no fim

Parei uma adolescente para perguntar o que significava aquela patifaria.

"- Hoje no mundo inteiro, nesta mesma hora, está rolando um protesto para que a banda Rebeldes não acabe!"

Se fosse uma manifestação para que a banda acabasse, me envolveria, mas não era o caso.

Fiquei uns dez minutos olhando a cena, e rindo. Como tem gente que não tem o que fazer no mundo inteiro, não?

domingo, 17 de agosto de 2008

A casinha

Eu devo ser um bosta. Um grandissíssimo merda, é isso que eu sou.

Casei com Carla quando ela ainda tinha Vinte e um anos. Vinte e um anos.

Lembro do dia em que a pedi em casamento. Ela saiu correndo pela casa feito uma criança quando acaba de ganhar aquele brinquedo com o qual tanto sonhou.
Eu já estava indo para o meu segundo casamento. Não via tanta novidade nesta história. Mas ela, pobrezinha, estava tão feliz, que não tive coragem de desapontá-la contando a real história dos casamentos. Não era justo acabar com a brincadeira de casinha dela.

Acredito que elas comecem ensaiando desde cedo. Montam a casinha, colocam filhos nela, e pegam qualquer moleque para ser pai, mesmo que ele não queira. Elas forçam o coitado, que acha tudo aquilo uma grande chateação, a participar da brincadeira delas.

Acho que com a Carla aconteceu a mesma coisa. Ela me pegou pelo braço e me forçou a brincar de casinha com ela. Me fez comprar um apartamento, comprar móveis, e a preparar uma festa de casamento. Era isso, ou nada. Com ela não havia meio termo.
E eu fiz tudo isso por um órgão genital feminino. O que não fazemos por sexo de qualidade?


No primeiro ano de casamento só fazíamos isso. Na sala, no quarto, no banheiro, na varanda, no chão, na pia, até em cima do fogão. Carla jamais negava meus pedidos. Em contra partida, eu brincava de casinha com ela.
Ela me pegava pela mão e mostrava para as amigas, mostrava o quanto eu a amava, o que eu havia dado de presente de um ano de casamento, mostrava fotos de nossas viagens, dizia que eu era um homem exemplar. Eu sempre sorria e concordava dizendo que ela que era sensacional.

No segundo ano ela começou a reclamar da pia, estava molhada, reclamou do chão, do sofá, do banheiro, e com o passar do tempo, nem na cama ela queria mais.
Eu já estava ficando impaciente com tanto pudor.
Dizem que casamento é até que a morte nos separe. Na minha opinião, ele é até que o sexo falte.

Eu cumpria a minha parte no acordo. Trabalhava de terno, chegava cansado e a beijava na testa, tomava banho, jantava, até lavava a louça.

Um dia cansei de tudo isso. Já era meu segundo casamento. A experiência me dizia que era daí para a lama total.
Desta vez faria como todos os meus amigos. Não acabaria com o casamento, mas teria uma amante.

Ana Carolina era o nome dela. Jovem, bonita e fogosa. Impressionante como as mulheres quando querem sua alma são fogosas.
Ana Carolina não tinha pudores. E o tempo todo dizia que faria tudo aquilo que Carla não fazia.

O caso durou cinco meses. Depois deste tempo ela queria que eu largasse a minha mulher para ficar com ela.
Eu não queria mais brincar de casinha com mais ninguém. Se fosse para brincar, eu brincaria com a minha mulher mesmo.

Tive muitas. Loiras, morenas, ruivas, japonesas, negras, e no final, todas queriam a mesma coisa, casar comigo.

Acabo de completar 60 anos. A minha companhia é um remédio de coloração azul que me obrigo a tomar para cumprir minha função de marido, com Carla, claro.

Minha neta está brincando na sala. Montou a casinha e neste momento alimenta a boneca.
Pode passar mil anos. Mas as mulheres sempre vão querer a mesma coisa, assim como nós homens queremos sempre a mesma coisa - sexo.

Agora que o sexo deixou de ser tão importante, eu brinco de casinha. Uma casinha lotada de gente, e me sinto um merda. Carla sempre foi inteligente. Encontrou a felicidade no cotidiano.
Eu deixei meu cotidiano passar, e agora me sinto um merda.
A casinha continua funcionando muito bem, já meu pênis, quanta diferença.

domingo, 10 de agosto de 2008

Grande Seu Fulano

O Veríssimo tem uma crônica ótima chamada “Grande Edgar”.


Acho que todo mundo já passou por uma situação Edgard.


A pessoa chega toda feliz por te encontrar e faz aquela perguntinha: “Não se lembra de mim?”. Você não lembra. Mas não quer ser desagradável. É aí que mora o perigo.


Esses dias eu estava esperando uma amiga no ponto de ônibus. Fiquei alguns minutos olhando os transeuntes. Eis que de repente desce um cidadão do ônibus e vem em minha direção. Braços abertos, sorriso largo, cecê vencido e me abraça.


- Puta merda, como você cresceu! Já é uma mulher!!!


Na minha mente eu brincava de cara-cara. Subiram todas as carinhas e eu não conseguia saber quem era o fulano.


Disfarçadamente fui saindo do abraço caloroso e fui me afastando com cara de “vem cá, te conheço?”.


- Está estudando ainda?


- Não, já terminei a faculdade.


- Puta merda, o tempo passa...


- É...


- E o Beto? Como ele está?


- Eu não conheço nenhum Beto.


Aí lá veio ele novamente dizer que eu estava grande e querendo me abraçar. Desta vez eu não agüentei.


- O senhor pode fazer a gentileza de me soltar? Não conheço nenhum Beto. E acho que nunca te vi mais gordo. Isso é um grande equívoco.


- Oras, seu nome não é Viviane?


Depois do meu fora, me neguei.


- Não, não me chamo Viviane.


- O nome da sua mãe não é Augusta?


Caralho, ele me conhecia. Não pensei duas vezes.


- Não, minha mãe não é Augusta.


- Me desculpe, mas é que você é a cara da Viviane filha da Augusta.


- Tudo bem, moço. Isso acontece. Tenho uma cara comum. Vivem me confundindo com alguém. (Sorriso)


Cínica, cínica, cínica. Por este episódio eu deveria receber 100 chibatas.


Mas tem coisa pior do que prolongar uma situação dessas?

Conselho

Se conselho fosse bom, não se dava. Mas este eu achei de suma importância:

"Jamais, sob quaisquer circunstâncias, tome um remédio para dormir e um laxante na mesma noite" - Fernando Veríssimo.

Escreveu

Deitada em seu sofá de barriga para baixo e pés para cima. Ao som o melhor de Aretha Frankin.
As canetas eram coloridas. A cada frase mudava de cor. E em pouco tempo tinha escrito o seu dia. Dia este que durou 24 horas, mas que levou apenas 12 minutos para ser escrito.

Falou sobre o tempo, sobre as sensações, sobre seus medos, planos, fatos, tudo em 25 linhas.

A vida resumida tinha uma certa graça. Se a vida pudesse ser editada...
Tirava-se aquele momento em que o chefe a chamou de incompetente, aumentaria o tempo em que ficou ao lado daquele carinha bonitinho do décimo andar, alterava-se o figurino. Afinal de contas, ela não estava vestida com o seu melhor modelito naquele momento.
Edita-se o barulho de escritório, e coloca-se uma bela balada romântica. Perfeição.

O diálogo poderia ser mais obsceno. Caras, bocas, sorrisos, sensação de vermelhidão no rosto quando ele elogiava seu cabelo.

Pensou em editar seu diário. Escrever coisas realmente interessantes. Adicionar um pouco mais de tempero em suas histórias. Terminá-las de uma forma que ela se desse bem no final, sempre.
As mocinhas vivem felizes para sempre. Ela era mocinha, tinha este direito.

Depois de tantos devaneios, ateve-se ao fato de que não valia a pena mentir daquela forma para ela mesma. Mais valia a realidade sem graça, do que uma mentira suntuosa.

Fechou o diário e foi dançar, sozinha. Girou, girou, gritou, cantou, e por alguns minutos se sentiu a pessoa mais feliz do mundo.

No dia seguinte queria contar histórias verdadeiras e felizes. E como autora, e personagem principal, tinha este direito. 25 linhas seria pouco demais para o dia seguinte.

Por enquanto

No começo, não se conta as horas em horas, nem os dias em dias. É tudo sensação. Uma vaga idéia do tempo que passa, porque é escuro e claro lá fora, porque às vezes se trabalha e outras vezes não, porque os amigos fazem anos, os feriados acontecem, mas não existe lógica, nem total apreensão das coisas. Se eu choro, o meu choro é devaneio abstrato. A saudade é tão primeira e irracional, que ainda sinto o seu cheiro na saudade. Você há pouco estava aqui.

Depois, as formas vão de novo desenhando as coisas. Devagar, eu reconheço o meu quarto. Sei que está vazio. Já sou capaz de discernir algumas vozes, ler o jornal, tomar o café, responder a pequenas questões sobre a vida. Eu tenho noção do que acabou, do que esteve e já não está. A saudade é segunda – compreendida e qualificada. De repente, me deixou triste saber que não fizemos fotos, mas eu já solto risadas para surpreender o silêncio. Na primeira semana, o silêncio é de ensurdecer a alma, me diz o horóscopo.

O horóscopo se apropria de fragilidades. Diz que o inferno começou no instante em que o Sol flertou com Câncer. Repara como não temos culpa de nada: somos fantoches dos astros. Como um louco, eu te pergunto as coisas, e você responde. A sua imagem é relutante como a de um holograma, e já passa pela minha cabeça a idéia, que ainda nego ferozmente, que talvez eu esteja completamente só.

Então, deixa passar a solidão por Câncer, deixa assentar a poeira das estrelas, dos humores, cessar de vez a rebordosa astral. Eu ando calado, como um bichinho cooptado pelos hábitos domésticos, falando pouco, de poucos amigos. Veja você que ironia, eu ando falando quase nada. E ainda me deito e levanto abstinente, como se faltasse uma última dose na veia. Era químico o meu amor, eu acho. E acho em versos toscos, não me arrisco em estrofes articuladas (não nasci para a poesia). Meus pesadelos são como aqueles que devem ter os adictos, cheios de refluxos e personagens falhos. E você vive livre neles, transita desimpedido entre maus e bons sonhos, enquanto eu te adoro, te odeio, te justifico, te invento e te mato. Agora é deixar que a Lua se entenda com Escorpião. E alguém virá recolher as garrafas vazias, limpar as cortinas do cheiro do cigarro, dizer: amanheceu, rapaz; outra festa só amanhã.

Quando o sol passar por Leão, eu serei feliz de novo. Por enquanto, ainda te amo.

(Roberto Vitorino - 13 de Julho de 2008)

Oco

O meu cérebro está oco!

Faz mais de um mês que nem gibi eu leio.
E uma coisa é fato, quem não lê, não pode escrever.

Acho que este é o real motivo de tanta ausência no blog. Não tenho sobre o quê escrever.

Poderia escrever sobre as Olimpíadas, mas isso o jornal, a internet, e todos os meios de comunicação já fazem. E com certeza melhor que eu.

Ultimamente não tenho tido tempo nem para dar os meus conhecidos foras.

A semana passa tão rápido que eu nem vejo. É impressão minha, ou o tempo está mais rápido
?

Não sei o que acontece. Só sei que tudo tem sido tão igual, que a inspiração, se é que ela já existiu, foi dar uma volta e nunca mais apareceu.
Tipo aquelas histórias do cara que foi comprar cigarro e a família agora coloca fotos em postes da cidade procurando por ele.

Acho que vou fazer isso. Colocar fotos do meu cérebro pela cidade de São Paulo. Quem sabe assim ele dá sinal de vida.

Só sei que o pulso ainda pulsa, já a criatividade...

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Difícil entender

Parecia uma piada de péssimo gosto. Mas infelizmente não era.
Ouvir que você não fará mais parte dos meus dias nunca mais foi a pior notícia dos últimos tempos.
Os jovens não deveriam morrer. Ainda mais alguém tão jovem quanto você.

Aquela pessoa que estava ali, estática, sem nenhum sorriso para oferecer, não era você.
Pentearam seu cabelo de um jeito que você não gostava, lhe vestiram com uma camisa que em sã consciência você nunca usaria.

Faltou o sorriso. Faltou o brilho nos olhos, as piadas, os comentários sem noção. Faltou a pessoa que me fazia rir com facilidade.
Difícil acreditar no que os olhos viam.

Às vezes a vida é tão ilógica que dá até medo.

Você foi embora.
Alguns dizem que para um lugar melho. Outros dizem que você descansou. Mas descansou de quê
?
Como uma pessoa feliz, cheia de vida, entusiasmo, descansa
?
Se eu soubesse a resposta, questionaria quem decidiu que sua estadia aqui na Terra acabaria assim de forma tão rápida.
Disseram que os bons vão embora cedo. Talvez você deveria ter sido mau.
Talvez assim você não teria deixado tanta saudade.

Parece que vou acordar e perceber que tudo foi um pesadelo.
Você vai chegar na minha sala, brigar comigo, como sempre fazia, dar uma gargalhada e dizer que nos enganou direitinho. Desta vez eu nem me importaria.

A única coisa que consigo pensar neste momento é que seja lá onde você estiver agora, está rolando uma grande festa. Porque é assim que todos nós lembraremos de você, uma pessoa que levava alegria por onde passasse.

Adeus, "queri".