Eu acordava cedo. Gostava de chegar cedo.
Levantava com uma preguiça do tamanho do universo, e com o pensamento de "Quando meus pais milionários vão aparecer para me resgatar?". Isso nunca aconteceu.
O banho demorava um pouco, mesmo sabendo que precisava economizar. Economizava água de outras formas. Mas no banho, não conseguia.
Escolhia a roupa, me trocava lentamente. Em dias de TPM, isso acontecia mais lentamente ainda porque nenhuma roupa era boa. O mundo não era bom nesses dias.
Ficava uma hora e meia no trânsito para chegar.
E, neste caminho, eu lia besteira no Facebook, respondia mais besteiras no grupo do Whatsapp, e ouvia a CBN. Uma longa jornada.
Dias iguais.
Aprendi que "Bom dia" não faz mal à ninguém.
Então, ao chegar ao trabalho passava pelos corredores cumprimentando as pessoas.
Sempre achei que um "Bom dia" dado com vontade, faz o dia melhor.
Tinha mudado recentemente para um novo "desafio". Desafio. Mais do mesmo. Mas chamaram de desafio. Assim como às vezes enganamos as crianças com o famoso "Não vai arder" do merthiolate no machucado fresco. Era assim que me sentia. Passando merthiolate no machucado fresco.
E a Índia? E o plano? E os pensamentos? Não sei. Se perderam. Deixe me perder sufocada por um monte de processos e papéis que já não estavam fazendo tanto sentido assim.
O tesão se foi. Acabou. Finito.
E aí você vira prostituta. Faço pelo dinheiro mesmo.
Nunca tive vocação para puta.
E, no meio do tiroteio, do matar ou morrer, onde cabeças rolam de hora em hora, eu decidi dizer o famoso "Não estou feliz aqui. Não gosto de trabalhar aqui. Façam o que acharem melhor".
E o universo é mágico, crianças. As fadas, elfos, poderes superiores, escutam a gente. E, quando o pedido é feito de coração, ele é atendido.
Uma semana depois me mandaram embora - Redução de quadro.
Desde que o mundo é mundo usam esta desculpa. Acho que para consolar quem se vai. Para se consolar, para evitar o confronto, ou qualquer outra coisa.
Nunca tinha sido mandada embora em toda minha vida. Foi a primeiríssima vez. Era virgem nisso.
É assim, parece que um tiro ecoa dentro de um submarino. Não faça a experiência!
Você fica zonzo, as coisas ficam em câmera lenta.
Aí você assina uns papéis que sequer lê porque ainda está com o zunido na cabeça.
E, você entrega o que estava fazendo, como se fosse um assalto "Passa notebook, celular...", e você entrega tudo.
No meu caso, sai de lá querendo ser qualquer coisa.
Vender coco na praia, fazer um curso de miçanga, ser a primeira mulher a pisar em Marte, escrever um livro, fazer um roteiro, começar um stand up, ser pastora de igreja, e um mundo de possibilidades.
Sim, existe um mundo de possibilidades. Mas acabamos sempre voltando para o que é conhecido e seguro.
Poucos e admiráveis são os que tem culhões para inovar. Poucos são os que querem fazer diferente.
Será que desta vez eu consigo?
Voltarei a me prostituir?
O tempo, e a água que baterá em minhas nádegas dirá.
Até lá, vou escrever sobre isso que pelo menos é divertido.