quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Otto Lara Resende

Graças ao Nelson, O Rodrigues - me encantei pelo Otto Lara Resende. De tanto ler crônicas do Nelson referindo-se ao Otto, cheguei ao Otto (já gastei tudo do Nelson). De uns tempos pra cá tenho lido o Otto. E Otto virou meu amigo, já não uso mais o sobrenome. Assim como é com Nelson, Xico, João, e muitos outros autores que gosto. 

Mas dizia eu que estava lendo Otto hoje pela manhã. Bem, nem sei se disse, mas agora está dito.

Ele tem uma crônica chamada "Vista Cansada", e eu gosto demais dela. Surrupiarei um teco.

"Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta. Um poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a gente banaliza o olhar. Vê não-vendo". 


E depois de ler isso, fechei o livro e comecei a ver - vendo. E o que eu vi? Um monte de gente que vê - não vendo!


Já notaram que as pessoas no metrô andam como morcegos guiados pelo som? Deixa eu explicar. Abrem as portas da estação, as pessoas saem mexendo no celular, lendo, com a cara pra cima, menos olhando -vendo. Entende?

Guiam-se pelo som, pelo cheiro, sei-lá que cacete é isso. Mas é assim. 
E no metrô você pode olhar pra geral, pode olhar mesmo, porque NINGUÉM olha para ninguém. 

E foi assim da Ana Rosa até o Tietê. Eu olhando-vendo, e  ninguém notando. E isso, no meu âmbito de retardo, me fez rir. E eu rindo, e ninguém notando. Passei do riso à incredulidade. Da incredulidade à solidão profunda. Isso tudo da Ana Rosa ao Tietê. Uma vida de observação em algumas estações do metrô. 


Em dado momento pensei em chorar. Mas de nada adiantaria meu pranto de mocinha da novela das 20h. Ninguém faria nada. Estavam hipnotizados. Foram abduzidos, não sei. Só sei que não existe vida no metrô de São Paulo. Ninguém olha ninguém. É uma massa teleguiada por algo que não achei explicação.



Brilhantemente Otto disse exatamente o que eu senti.


"O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que, de fato, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho. Marido que nunca viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos olhos se gastam no dia-a-dia, opacos. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença".